Andrew Watson

Andrew Watson (Demerara, 4 de março de 1856 Londres, 8 de março de 1921) foi um futebolista nativo da atual Guiana que defendeu a Seleção Escocesa de Futebol, tornando-se o primeiro negro a figurar em partidas de seleções nacionais, em 1881, em vitória de 6-1 no clássico contra a Inglaterra,[1] sendo inclusive o capitão do elenco escocês. Era filho de uma ex-escrava, Anne Rose, com um barão do açúcar, o escocês Peter Miller Watson.[2][3][4] Também foi o primeiro negro campeão de uma competição oficial de futebol, a Copa da Escócia.[2]

Andrew Watson
Andrew Watson
Com a seleção escocesa em 1882, ocasião em que a camisa azul marinho deu
lugar à listrada em amarelo e rosa, cores de Archibald Primrose, 5.º Conde de Rosebery
Informações pessoais
Nome completo Andrew Watson
Data de nascimento 4 de março de 1856
Local de nascimento Demerara, Guiana Britânica
Nacionalidade britânico
Data da morte 8 de março de 1921 (65 anos)
Local da morte Londres, Reino Unido
Informações profissionais
Posição zagueiro
Clubes profissionais
Anos Clubes Jogos e gol(o)s

1874–1880
1880–1882
1882–1884
1884–1885
1885–1887
1887–1892
Maxwell
Parkgrove
Queen's Park
Swifts
Corinthian
Queen's Park
Bootle
Seleção nacional
1881–1882 Escócia 00003 000(0)

Carreira

Assumido pelo pai em tempos de racismo e segregação mais explícitos, com respaldo científico, Watson foi educado no King's College de Londres e de lá seguiu para a Universidade de Glasgow, onde teve seus primeiros contatos com o futebol. Após defender Maxwell e Parkgrove, rumou ao Queen's Park,[2] clube considerado como introdutor do "futebol-arte" e do "futebol científico", ao difundirem os fundamentos da troca de passes e dribles, sendo considerado a primeira grande potência do esporte na Escócia a ponto de disputar a própria Copa da Inglaterra na época.[5] No anuário de 1880-1881 da Associação Escocesa de Futebol, Watson foi elogiado como "um dos melhores defensores que nós temos. Desde que ele se juntou ao Queen’s Park, ele tem evoluído bastante; tem uma grande velocidade e é esplêndido nos desarmes; chute certeiro e poderoso; digno de jogar em qualquer equipe".[2]

Bicampeão da Copa da Escócia com o clube de Glasgow, principal fornecedor de jogadores da seleção escocesa, realizou pouco depois sua estreia por ela. Foi contra a rival Inglaterra, no Oval em Londres. A despeito disso, os escoceses venceram por 6-1, resultado que à altura de 2019 seguia sendo a derrota mais elástica que os ingleses sofreram em casa. Watson foi o capitão, com os vencedores trajando-se de amarelo e rosa, cores de corrida do Lord Rosebery, resgatadas em um uniforme reserva já na década de 2010.[4] Watson fez outros dois jogos pela Escócia até 1882, ambos vitórias por 5-1, sobre o País de Gales e novamente contra os ingleses.[2] Eram também tempos em que a Escócia mostrava-se dominante no principal clássico britânico, com dez vitórias e só duas derrotas entre 1874 e 1887 e supremacia no duelo direto contra a Inglaterra até 1983.[6]

Watson não fez mais jogos pela seleção por ter voltado a Londres pouco depois, em tempos em que a Escócia se limitava a convocar quem atuasse na própria nação. Na Inglaterra, Watson chegou a defender outra potência da época, o Corinthian,[2] clube de amadores criado exatamente como reação inglesa à força inicial imposta pelos vizinhos escoceses.[5] Watson inclusive figurou em vitória por 8-1 em amistoso contra o Blackburn Rovers, então campeão profissional da Copa da Inglaterra, em resultado que atestava a qualidade da equipe amadora do Corinthian. Graduado em engenharia e herdeiro do patrimônio milionário do pai, Watson permaneceu oficialmente como atleta amador, voltando ao Queen's Park. No regresso ao clube de Glasgow, exerceu também funções administrativas. Ainda viria a defender o Bootle, onde parou de jogar; tratava-se do primeiro rival do Everton em Liverpool.[2]

O próprio Queen's Park, clube escocês mais antigo, manteve política de manter-se amador até 2019,[7] o que lhe atrofiaria mesmo na própria cidade de Glasgow para a dupla Celtic e Rangers, embora detenha a propriedade do principal estádio escocês (o Hampden Park) e permaneça tendo menos troféus apenas em relação a ambos na Copa da Escócia (dez).[8] A mudança ao Bootle, por sua vez, estabeleceu Watson como residente em Liverpool por vinte anos, voltando ele a morar em Londres desde então. Na capital britânica, faleceria em decorrência de uma pneumonia, já sob pouca ou nula atenção midiática.[4]

Legado

Quinze anos depois de seu falecimento, Watson foi eleito para a melhor seleção escocesa da história, no posto de zagueiro pela esquerda.[4] Desde a década de 1910, enquanto ainda vivia, negros e mestiços já figuravam nas principais seleções sul-americanas, notoriamente com os casos de Isabelino Gradín pelo Uruguai, Arthur Friedenreich pelo Brasil e José Durand Laguna pela Argentina.[9] Porém, as nações europeias ainda tardariam cerca de meio século após as partidas de Watson pela Escócia a também utilizarem não-brancos - começando por Vahap Özaltay pela Turquia em 1927; Eddie Parris pelo País de Gales e Raoul Diagne pela França, ambos em 1931 (Diagne, curiosamente, também veio das Guianas, nascido na francesa); e Guilherme Espírito Santo por Portugal em 1937.[1] Falecido ainda em 1921, Watson já não vivia para acompanhar nenhuma dessas estreias.[4]

Apesar da gradual adoção de não-brancos pelas seleções da Europa a partir daquela virada da década de 1920 para a de 1930, apenas no fim da de 1970 é que as vizinhas Inglaterra e Irlanda adotaram seus pioneiros nesse sentido (Viv Anderson e Chris Hughton, respectivamente). Se o vizinho Gales promovera seu primeiro negro ainda em 1931,[1] o primeiro utilizado pela Irlanda do Norte, Jeff Whitley, estreou por ela apenas em 1997.[10] A despeito do pioneirismo com Watson, a Escócia só voltaria a adotar um não-branco por volta dessa mesma época - primeiramente, com Paul Wilson, de parcial origem luso-indiana, em 1975. E um segundo negro, por sua vez, somente veio a aparecer mais de 120 anos depois de Watson, com Nigel Quashie estreando em 2004 pelo Tartan Army,[4] seguido por Chris Iwelumo em 2008.[11] Antes da estreia destes dois, à altura da Copa do Mundo FIFA de 1998, precisamente a última com participação dos escoceses, a absoluta homogeneidade de brancos na seleção deles chegou a ser ironizada pelo humorista brasileiro Bussunda: "no primeiro jogo, descobri porque é que não tem negro no time da Escócia. Iam ter que aumentar o tamanho da saia...".[12]

Em 2011, Watson foi selecionado para o Hall da Fama do futebol escocês.[4]

Títulos

Queen's Park

Referências

  1. TOMA, Razvan (31 de janeiro de 2019). «Colourful Pioneers» (em inglês). RSSSF. Consultado em 20 de fevereiro de 2020
  2. STEIN, Leandro (12 de março de 2014). «Há 133 anos, o filho de uma ex-escrava se tornava o primeiro negro a defender uma seleção». Trivela.com. Consultado em 18 de fevereiro de 2020
  3. STEIN, Leandro (19 de setembro de 2014). «Dez momentos em que o futebol escocês ficou à frente do inglês». Trivela.com. Consultado em 18 de fevereiro de 2020
  4. «The story of Glasgow student Andrew Watson who became Scotland's first black football player». Glasgow Live. 12 de março de 2019. Consultado em 3 de julho de 2020
  5. STEIN, Leandro (15 de setembro de 2014). «Como os escoceses ensinaram o mundo a jogar o futebol-arte». Trivela.com. Consultado em 18 de fevereiro de 2020
  6. STEIN, Leandro (19 de setembro de 2014). «Dez momentos em que o futebol escocês ficou à frente do inglês». Trivela.com. Consultado em 18 de fevereiro de 2020
  7. STEIN, Leandro (15 de novembro de 2019). «Fim de uma era: Após 152 anos, o clube mais antigo da Escócia vai se tornar profissional». Trivela.com. Consultado em 20 de fevereiro de 2020
  8. VIGNOLI, Leandro (2017). 8. Os últimos Reis da Escócia. À sombra de gigantes: uma viagem ao coração das mais famosas pequenas torcidas do futebol europeu. São Paulo: L. Vignoli, 2017, pp. 87-98.
  9. BRANDÃO, Caio (20 de novembro de 2012). «Afro-argentinos no futebol». Futebol Portenho. Consultado em 20 de fevereiro de 2020
  10. «Jeff's Irish ambition» (em inglês). Chronicle Live. 1 de fevereiro de 2004. Consultado em 9 de setembro de 2020
  11. «Scots go for Iwelumo». Evening Standard. 2 de outubro de 2008. Consultado em 3 de julho de 2020
  12. BUSSUNDA (jul. 1998). Um paparazzo na França. Placar n. 1141. São Paulo: Editora Abril, pp. 112-113
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