O Seminarista (Rubem Fonseca)

O seminarista é um romance policial de Rubem Fonseca publicado inicialmente em 2009 no Brasil. O seminarista foi o 11º romance de Rubem Fonseca, tendo sido escolhido pelos leitores do Jornal do Brasil como o melhor livro publicado no país em 2009.[1]

O seminarista
Autor(es) Rubem Fonseca
Idioma português
País  Brasil
Género Romance policial
Editora Agir
Lançamento 2009
Páginas 184
ISBN 978-85-2201-064-6
Edição portuguesa
Editora Sextante Editora
Lançamento 2010
ISBN 978-989-676-023-6

O livro representou o regresso de Rubem Fonseca ao género policial após o seu anterior romance que havia sido Mandrake, a Bíblia e a bengala, de 2005, e também a sua primeira obra para a nova editora. Tratou-se também da primeira obra literária inédita a sair no Brasil com versões para Kindle e iPhone.[1]

Para o protagonista de "O seminarista", matar não causa remorso, mas também não causa prazer. É apenas o seu trabalho que lhe permite se dedicar àquilo de que realmente gosta - livros, filmes e mulheres. Não quer saber quem é a pessoa que elimina, nem mesmo lê os jornais do dia seguinte para o saber. Quando, no entanto, decide que é hora de se aposentar, descobre que não ficou imune aos efeitos dos seus "serviços" anteriores, e tem que enfrentar os fantasmas de um passado que pensava estar superado. [2][3]:Contracapa

Sinopse

O protagonista e narrador de "O seminarista" é um assassino a soldo, designado inicialmente por "Especialista" por ser eficiente no seu ofício. De tempos a tempos, recebe encomendas de um misterioso "Despachante" para fazer certos «serviços», executados com eficácia, e sem quaisquer sentimentos de culpa («para um matador profissional a pior coisa do mundo é ter uma consciência»).[4]

Nos primeiros capítulos, o "Especialista" começa por explicar como realizou alguns dos trabalhos. Se o «freguês» (a vítima) merece morrer é questão que não o preocupa, mas prefere eliminar «gente ruim» – um pedófilo, um violador de cadáveres roubados no cemitério, um outro assassino profissional –, embora não lhe tire o sono se abater alguém que se mascarou de Pai Natal ou um «freguês» que se desloca numa cadeira de rodas empurrado por enfermeira. O modus operandi não varia: «Sempre dou um tiro na cabeça. Com esses coletes novos à prova de bala, aquela técnica de atirar no terceiro botão da camisa para furar o coração pode não funcionar.»[4]

Um dia, decide aposentar-se. Com o rendimento dos trabalhos anteriores, muito bem pagos, juntou uma boa reserva e agora quer parar. Ex-seminarista, e daí o nome do livro, do seminário manteve o hábito de fazer citações em latim dos clássicos. Do que mais gosta é ver filmes, ler (especialmente poesia) e ter sexo com mulheres – não necessariamente por esta ordem. Gosta ainda de vinho, de futebol (sendo torcedor do Vasco da Gama) e de ouvir rock no mp3.[4]

Mas a condição de assassino não se abandona facilmente, especialmente quando para trás ficaram assuntos mal resolvidos. O Especialista muda de nome, passando a ser José Joaquim Kibir, em homenagem a um antepassado que escapou da «carnificina de Alcácer-Quibir», a batalha em que «Portugal se fodeu», e se apaixona por uma alemã que é tradutora e adora Clarice Lispector. Mas a «terrível simetria» da pistola Glock volta a arrastá-lo para o mundo negro do crime.[4]

O que se segue, refere José Mário Silva, é uma intriga complexa em que todos desconfiam uns dos outros, um enredo tarantinesco de traições e ajustes de contas sucessivos, uma trama algo caótica e algo inverosímil, culminando num crescendo de violência – profusão de dedos partidos, balas nas têmporas, línguas cortadas, choques eléctricos nos testículos, olhos furados – que funciona como uma paródia do thriller e dos seus lugares-comuns, sublinhados pelo recurso à ironia e ao exagero.[4]

Apreciação crítica

Conclui José Mário Silva, que o verdadeiramente importante é a escrita, a linguagem flexível, precisa e inventiva de Rubem Fonseca, a sua prosa cantabile, os seus magníficos diálogos. Na altura com 85 anos, Fonseca continua a ser um dos maiores mestres no uso da língua portuguesa. E mesmo ficando aquém de outros romances seus, como A grande arte ou Bufo & Spallanzani, O seminarista é uma prova eloquente dessa mestria.[4]

Para Ana C. C. Viegas, nos primeiros capítulos de O seminarista, o leitor se depara com uma sequência de crimes executados e narrados de modo frenético por um matador profissional, que pretende se retirar da actividade e ter uma vida pacata. A narrativa, porém, ganha outra dimensão, quando o matador se transforma ele próprio em alvo de perseguição. Nesse momento, o protagonista vê-se numa armadilha e para salvar a própria pele, precisa reavaliar os crimes que cometeu antes e tomar ele próprio a investigação de crimes recentes.[5]

Ainda para Ana C. C. Viegas, como ocorre em outros livros do autor, a violência em O seminarista constitui o pretexto para, através de reflexões sobre a linguagem, colocar em causa verdades estabelecidas por se tratarem de formações discursivas historicamente construídas. Além disso, abandona-se a perspectiva de uma cidade partida, tão frequentemente veiculada pela mídia, pois a violência é muito mais complexa e transcende a fronteira das diferentes classes sociais. Em vez de guetos, o que se apresenta, sem maniqueísmo, são grupos que convivem no mesmo espaço da grande cidade regidos por relações de poder e pela agressão resultante de instintos humanos, revelando-se estereótipos sociais.

Conclui Ana C. C. Viegas que da sua formação religiosa ao ex-seminarista restam apenas fragmentos de textos em latim que perpassam pela narrativa. Num tempo em que a formação do gosto resulta da redundância e da resignação vendidas especialmente pelas mídias audiovisuais, este livro, privilegiando uma leitura pelo viés do foco narrativo, propõe-se trilhar um caminho de pistas falsas a fim de discutir o carácter desconstrutor do romance de Rubem Fonseca até mesmo em relação ao género policial canónico. [5]

Para Bolívar Torres, a repercussão do livro foi enorme comprovando a capacidade de renovação de Rubem Fonseca que chegou a um novo público, mais jovem. O romance mostra este pique jovial dele, com uma grande história contada de forma ágil. Um estilo que a crítica pode não gostar, mas que os leitores adoram. Fonseca utilizou a liberdade de sempre, de um escritor que tem o domínio absoluto do que faz.[1]

A busca por um público mais amplo e um possível reposicionamento de sua obra no mercado talvez esteja na origem da mudança súbita de editora, especulando-se que o acerto entre as partes não tenha saído por menos de R$ 1 milhão.[1]

Prossegue Bolívar Torres, que O seminarista, última incursão do romancista no thriller, traz um novo rosto à vasta galeria de personagens fonsequianos: o cínico e estoico matador José, apreciador de pistolas, poesia, rock e aforismos latinos, aprendidos no tempo em que era seminarista, e que ressurgem em sua mente entre um e outro "serviço" intermediado pelo misterioso "Despachante". Sendo difícil de avaliar se José é um dos personagens mais pessoais de Fonseca, o certo é o autor ter colocado nele alguns dos seus próprios gostos e hábitos.[1]

Para o editor Paulo Pires, é possível que esta seja a primeira de muitas histórias de "José", que já havia aparecido em outros três contos da colectânea Ela e outras mulheres (2006): Belinha, Olívia e Xânia. Fonseca terá confidenciado que o personagem pode se tornar recorrente, como Mandrake.[1]

A busca por uma melhor comunicação com os leitores jovens recorreu às novas potencialidades da internet tendo sido criado um trailer narrado pelo próprio autor.[1]

Bibliografia

  • Bruno Lima Oliveira, "Os Seminaristas de Bernardo Guimarães e Rubem Fonseca: Leitura comparativa à luz dos ateus Dawkins e Eagleton", in Revista Estação Literária, Vol 3, pag. 396-410, Londrina, jan. 2015, ISSN 1983-1048

Referências

  1. Bolívar Torres, Jornal do Brasil,
  2. Livraria da Folha de S. Paulo,
  3. Rubem Fonseca, O Seminarista, Sextante Editora, 2010
  4. Página web de José Mário Silva, "Bibliotecário de Babel", em 21 de Setembro de 2010. Texto publicado no suplemento "Actual", do semanário Expresso.
  5. Ana Cristina Coutinho Viegas, "Mapeando pistas falsas – uma leitura do romance O seminarista, de Rubem Fonseca", texto apresentado no II CIFALE, 2013, FLUFRJ,
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