Pentecostes (Grão Vasco)

Pentecostes é uma pintura a óleo sobre madeira de Grão Vasco, mestre pintor português da Renascença, pintada em 1534-35 e que constituiu o painel central do retábulo da Capela do Espírito Santo do Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra, mosteiro onde ainda se encontra.[1]

Pentecostes
Pentecostes (Grão Vasco)
Autor Grão Vasco
Data 1534-35
Técnica pintura a óleo sobre madeira
Dimensões 166,5 cm × 165 cm 
Localização Mosteiro de Santa Cruz, Coimbra

No século XVIII a reforma do Mosteiro de Santa Cruz levou à demolição do Claustro da Portaria, a que pertencia a Capela do Espírito Santo, tendo a pintura Pentecostes, única sobrevivente da encomenda inicial de quatro pinturas feita pelo Mosteiro a Vasco Fernandes, sido transferido para a sala da Sacristia.[1]:265

Pentecostes é um exemplar único e fundamental na obra de Vasco Fernandes, testemunho da sua adesão aos valores do Renascimento italiano, perceptível de forma clara pela assinatura latinizante que inseriu na pintura: «VELASCS».[2]

A presença de Vasco Fernandes na ambiência humanista de Coimbra para a execução de Pentecostes e dos outros três painéis (desaparecidos) que Frei Brás de Barros lhe encomendou, deve ter influído na trajectória artística e na assimilação pelo pintor dos novos valores renascentistas.[1]

Descrição e estilo

A pintura representa o episódio da descida do Espírito Santo no dia do Pentecostes relatado no Novo Testamento (Atos 2:1–41) que deu origem a uma das mais importantes celebrações do culto cristão.

Segundo a historiadora de arte Dalila Rodrigues, nota-se uma intensa expressividade e comoção como expressão do sentimento religioso nos rostos e figuras dos apóstolos que se agitam num arrebatamento transcendente. Ao centro e numa serenidade escultórica figura o grupo da trindade feminina, contrastando com o da agitação dos apóstolos. Uma luz intensa revela o centro do enquadramento arquitectónico depurado e de inspiração renascentista. [3]

O contraste entre o espaço cénico e as figuras femininas, e a forma elíptica constituida pelas figuras que envolvem esta trindade evidencia o eclectismo das componentes classicistas de Vasco Fernandes, sendo o dramatismo das figuras em primeiro plano, acentuado pela cor vermelha dos seus mantos, alheio a qualquer concepção classicista da figura humana. A contradição entre o classicismo da arquitectura e o dramatismo das figuras é uma das características da obra.[3]

Ainda para Dalila Rodrigues, a concepção e colocação cénica das figuras e o cromatismo invocam um modelo ou resultam de uma reflexão profunda, sendo a latinização da assinatura, que figura em primeiro plano sobre um pergaminho enrolado, sintoma do recurso a um novo estilo de linguagem pictural.[3]

Actualmente a pintura ostenta uma bela moldura contemporânea mas que não será a original. Pelo exame radiográfico detectaram-se na pintura marcas nos cantos superiores pertencentes à talha da estrutura que o emoldurara inicialmente.[2]

História

Reynaldo dos Santos, no Livro da Receita e Despesa do Mosteiro de Santa Cruz, encontrou no ano de 1534-35 um recibo de pagamento a Vasco Fernandes de uma prestação de quatro retábulos executados para este mosteiro o que provou definitivamente a autoria e cronologia da obra. Desta importante e documentada empreitada de quatro painéis retabulares apenas sobreviveu o extraordinário Pentecostes.[4]

Em 1541, D. Fernando de Mendanha considera a obra pintada “por mão de outro Apeles”. Em finais do mesmo século, Frei Jerónimo Roman, descrevendo também minuciosamente o mosteiro, refere-se à capela do Espírito Santo da seguinte forma: “mandada fazer por D. João III, excelente pela traça, é muito boa a mão de quem lavrou e pintou ali.[4]

Foi durante anos uma obra controversa, por se supor que a assinatura VELASC9 não correspondia à forma latinizada de Vasco.[4]

Após várias reformas acentuadas no Mosteiro, o Claustro da Portaria foi demolido, quando da construção dos Paços do Concelho, e Pentecostes, único sobrevivente da encomenda inicial, foi transferido para a sala da Sacristia onde tem permanecido exposta desde então. Desde 2003, ano em que decorreu a comemoração de Coimbra Capital Nacional da Cultura, Pentecostes foi novamente deslocado e colocado em destaque na sala principal da exposição à data intitulada “Memórias de Santa Cruz”, que decorreu na Sala do Refeitório do Mosteiro.[2]

Exposições

Resumo de participação de Pestecostes em exposições, com base na lista elaborada por Joana Salgueiro:[1]:265

  • 1940 – Exposição: “Os Primitivos Portugueses”, Lisboa: Museu das Janelas Verdes (Setembro – Maio)
  • 1955-56 – Exposição (Londres: Royal Academy of Arts): “Exhibition of Portuguese Art 800-1800”
  • 1982-83 – Exposição (Lisboa: Abril – Julho): “Os Descobrimentos dos Portugueses e a Europa do Renascimento” XVII Exposição Europeia de Arte, Ciência e Cultura. Em que Pentecostes seguiu em substituição do pretendido Calvário de Cristóvão de Figueiredo devido às grandes dimensões e dificuldade de deslocação desta obra.
  • 1991 – Exposição (Antuérpia/Bélgica: Koninklijk Museum voor Schone Kunsten – 29/09/91 a 29/12/91): “Feitorias: l'art au Portugal au temps des Grandes Découvertes (fin XIVe siècle jusqu'à 1548)”, Europália 91
  • 1992 – Exposição (Lisboa: Palácio da Ajuda – 17/03/92 a 10/06/1992): “Grão Vasco e a Pintura Europeia do Renascimento”. Por autorização do IPPAR e contra à decisão da Diocese. Foi negado que fosse figurar na «Expo92» em Sevilha, “Exposição Arte y Cultura en torno de 1492”. (de 18 de Março a 18 de Setembro), visto que as datas se sobrepunham à exposição portuguesa.
  • 2002 – Exposição (Salamanca: Colégio de Santo Domingo – 12/07/02 a 15/09/2002): “Grão Vasco e a Pintura Portuguesa del Renascimiento 1500.1540”
  • 2003 – Exposição (Refeitório do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra): “Pintura Manuelina de Coimbra – A Oficina de Gil e Manuel Vicente”, Coimbra Capital Nacional da Cultura 2003:
  • 2003-2012 - Exposição (Coimbra): “Memórias de Santa Cruz”, Refeitório do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra

Bibliografia

  • Aragão, Maximiano de (1900). Grão-Vasco ou Vasco Fernandes Pintor Viziense Príncipe dos Pintores Portuguezes. Viseu: Typographia Popular da Liberdade.
  • Câmara Municipal de Coimbra (2003). Memórias de Santa Cruz: Exposição (22 Dez. - 29Fev.). Coimbra: C.M.C..
  • Fonseca, Maria Constança Pinheiro da; Correia, Pedro; Gordo, João. Relatório de intervenção na pintura Pentecostes de Vasco Fernandes (Guia 40/91, Proc. Secretaria P.O.356, Restauro 34/91, Arquivo 1992). Lisboa: Instituto José de Figueiredo. 1991.
  • Rodrigues, Dalila, coord. (1992). Grão Vasco e a Pintura Europeia do Renascimento. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses.
  • Rodrigues, Dalila (2002) – Grão Vasco e a Pintura Portuguesa do Renascimento (c. 1500– 1540). Salamanca: Consorcio Salamanca 2002; Museus Grão Vasco.VIANA, Conceição;
  • Rodrigues, Dalila (2007). Grão Vasco. Lisboa: Alêtheia Editores
  • Salgado, António. "Relatório de intervenção na pintura Pentecostes de Vasco Fernandes" no âmbito da exposição de Salamanca 2002. Lisboa: ArteRestauro, 2002.
  • Vieira, Padre Dr. José Bento (2001). Santa Cruz de Coimbra: Arte e História. Coimbra:Igreja de Santa Cruz

Veja também

Referências

  1. Joana Silva Salgueiro, A Pintura Portuguesa Quinhentista de Vasco Fernandes: Estudo Técnico e Conservativo do Suporte, tese de doutoramento na Universidade Católica Portuguesa, 2012, pag. 32,
  2. Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho, Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra: estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro da pintura sobre madeira em Portugal,
  3. Dalila Rodrigues, Grão Vasco e a Pintura Europeia do Renascimento, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 1992
  4. Dalila Rodrigues (1992), citada por Joana Salgueiro, pag. 244-245
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